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O Ano Litúrgico se inicia com o Tempo do Advento que nos faz meditar sobre as três vindas de Jesus Cristo: que veio, vem e virá. Nosso Senhor veio, na história, na noite do Natal, vem em nosso dia a dia através dos Sacramentos, pela sua Palavra, naqueles que sofrem ou são marginalizados e virá, no final dos tempos para julgar os vivos e os mortos.

A Sagrada Liturgia divide este tempo em duas partes com tonalidade temática bem demarcada. A primeira, que se inicia com as vésperas do Primeiro Domingo do Advento e vai até o dia 16.12, inclusive, é chamada de Advento Escatológico, pois nestes dias, a Igreja deseja aprofundar o aspecto da segunda vinda do Senhor. Em Mc 13,33-37 Jesus nos adverte:

Cuidado! Ficai atentos, porque não sabeis quando chegará o momento. É como um homem que, ao partir para o estrangeiro, deixou sua casa sob a responsabilidade de seus empregados, distribuindo a cada um sua tarefa. E mandou o porteiro ficar vigiando. Vigiai, portanto, porque não sabeis quando o dono da casa vem: à tarde, à meia-noite, de madrugada ou ao amanhecer. Para que não suceda que, vindo de repente, ele vos encontre dormindo. O que vos digo, digo a todos: Vigiai! (Liturgia da Missa do Primeiro Domingo do Advento – ano B).

Como o trecho do Evangelho acima indica, somos chamados à vigilância. Essa atitude é própria daqueles que desejam encontrar o seu Senhor. Como homens e mulheres de fé não devemos nos preocupar com o dia e a hora, mas devemos estar atentos ao modo como estamos nos preparando. Como fazemos uso do tempo que Deus nos dá? Eis a grande questão! O ser humano é um composto de físico, espírito e intelecto, esses três compostos devem caminhar de maneira equilibrada para a nossa realização, enquanto esperamos a vinda do Senhor. Cuidar do físico que é o santuário de Deus (cf. 1Cor 3,17). Treinar o intelecto através do estudo, leitura e pesquisas, mas, sobretudo, vigiar o lado espiritual para que o Senhor ao chegar nos encontre em vigília e celebrando os seus louvores. Mas, como se cuida do espírito? Em primeiro lugar pela vida intensa de oração, motivados pela palavra de Deus e a meditação, chegaremos à oração pura que nos levará à contemplação. Se somos homens e mulheres de oração, livramo-nos das tentações e do pecado; passamos a pensar e agir conforme Jesus Cristo e dizer como São Paulo: “Já não sou eu que vivo é Cristo que vive em mim” (Gl 2,20). Essa atitude é o modo de estarmos vigilantes para a vinda do Senhor, anunciada no Tempo do Advento.

A segunda parte desse sagrado tempo litúrgico é a que chamamos de Advento Natalino ou Histórico que corresponde à semana que antecede o Natal, ou seja, do dia 17.12 à Hora Média do dia 24.12. Esse bloco se destina à preparação imediata da atualização (memória) da vinda de Cristo na história que celebraremos solenemente na Noite de Natal. O Antigo Testamento nos anuncia esta vinda, sobretudo, nas profecias de Isaías: “Nascerá uma haste do tronco de Jessé e, a partir da raiz, surgirá um rebento de uma flor; sobe ele repousará o espírito do Senhor: espírito de sabedoria e discernimento, espírito de conselho e fortaleza, espírito de ciência e de temor de Deus; no temor do Senhor encontra ele o seu prazer” (Is 11,1-3ª). Esta semana santa que antecede o Natal é enriquecida com os evangelhos das Missas diárias que seguem uma ordem cronológica das anunciações de João Batista e Jesus, passando pela genealogia do Senhor, o canto de Zacarias e da Virgem Maria, o nascimento do Batista para, finalmente, chegar à noite de Natal onde se medita a natividade do Redentor. Também, nesta semana, a Liturgia das Horas, no Ofício de Vésperas traz as chamadas Antífonas do “Ó”, fazendo alusão a essa interjeição que é o início de cada antífona. Assim temos os títulos messiânicos evocados no Antigo Testamento que agora lemos a partir do Novo: “Ó Sabedoria…; Ó Adonai (tradução do hebraico: o meu Senhor…; Ó Raiz de Jessé…; Ó Chave de Davi…; Ó Sol Nascente…; Ó Rei das Nações…; Ó Emanuel…” Essas antífonas estão no Lecionário Semanal (Ferial) como versículos para Aclamação ao Evangelho.

A tradição consagrou quatro figuras centrais para o Tempo do Advento: o profeta Isaías presente diariamente em todas as leituras e em parte no Tempo de Natal; João Batista que aparece no segundo e terceiro domingos como a voz que clama no deserto para prepararmos o nosso interior a fim de nos encontrarmos com o Senhor no final dos tempos e na noite de Natal através da Eucaristia; São José como o homem dos sonhos, sempre atento e obediente à vontade de Deus e a Virgem Maria que nos ensina a dizer sim ao Senhor e a vivermos na discrição meditando sua Palavra.

O terceiro domingo é, também, chamado de Gaudete (da alegria) porque retoma a antífona de entrada do missal para este dia, desejando antecipar as alegrias do Natal, por isso mesmo, o celebrante poderá usar paramentos cor-de-rosa e aconselha-se ornar o altar com flores. Não podemos esquecer que a simbologia deverá, sempre, levar-nos à interiorização do culto, pois toda a Liturgia está orientada para este fim, a nossa santificação, se assim não for, tudo se reduz somente ao aspecto teatral.

A escolha dos cantos, também, segue a orientação temática das duas partes do Advento: no escatológico, recordam a segunda vinda e a vigilância, no Advento Natalino vislumbram-se as profecias de Isaías e aqueles que tocam, mais diretamente, na vinda do Filho de Deus que está para ser atualizada na Noite de Natal.

Mesmo sendo um tempo litúrgico de quatro domingos e nem sempre quatro semanas inteiras para preparar as vindas de Cristo, o cristão vive num eterno advento, pois, desde o dia da Ascensão do Senhor esperamos a sua volta. Todos estamos lembrados das palavras dos anjos aos apóstolos no momento que o Senhor se elevou aos céus: “Homens da Galileia por que estais aí olhando para o céu? Este Jesus que se elevou vai voltar do mesmo modo como O vistes subir” (At 1,11). E, ainda, em cada Celebração Eucarística, logo após a Consagração: “Anunciamos, Senhor, a vossa Morte e proclamamos a vossa Ressurreição, vinde Senhor Jesus”.

E com o canto do Martirológio Romano sobre o Natal do Senhor, nós aguardamos a sua chegada. Poderá ser entoado ou proclamado na tarde do dia 24.12 ou mesmo antecedendo o canto do Glória a Deus nas alturas da Missa da Noite de Natal:

Vinte e cinco de dezembro, lua (lua do ano indicada no diretório litúrgico). Tendo transcorrido muitos séculos desde a criação do mundo, quando no princípio Deus tinha criado o céu e a terra e tinha feito o homem à sua imagem; e muitos séculos de quando, depois do dilúvio, o Altíssimo tinha feito resplandecer a arco-íris, sinal da Aliança e da paz; vinte séculos depois da partida de Abraão, nosso pai na fé, de Ur dos Caldeus; treze séculos depois da saída de Israel do Egito, sob a guia de Moisés; cerca de mil anos depois da unção de Davi como rei de Israel; na sexagésima quinta semana, segundo a profecia de Daniel; na época da centésima nonagésima quarta olimpíada; no ano setecentos e cinquenta e dois da fundação da cidade de Roma; no quadragésimo segundo ano do Império de César Otaviano Augusto; quando em todo o mundo reinava a paz, Jesus Cristo Deus eterno e Filho do Eterno Pai, querendo santificar o mundo com a sua vinda; tendo sido concebido por obra do Espírito Santo e transcorrido nove meses, nasce em Belém da Judeia; da Virgem Maria, feito homem. Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo a carne.

Que esse canto do anúncio da natividade do Redentor e a meditação piedosa das vindas de Cristo, no santo Tempo do Advento, possa nos conduzir àquela verdadeira alegria que é o nosso encontro pessoal com o Senhor, sempre atualizado em todas as Celebrações Eucarísticas, nos momentos de oração pessoal, nas relações interpessoais (com o próximo) e, também, na Noite do Natal quando cantamos juntos com os anjos: “Glória in exelcis Deo”!

 

Dom Bruno Carneiro Lira, OSB
Membro da Comissão Arquidiocesana de Pastoral para a Liturgia