O arcebispo de Olinda e Recife, dom Paulo Jackson, e o bispo auxiliar da Arquidiocese, dom Limacêdo Antonio, visitaram, nesta quinta-feira (19), a realidade de alguns acampamentos e assentamentos rurais do Movimento dosTrabalhadores Rurais Sem Terra (MST), localizados em municípios que fazem parte do território arquidiocesano. Acompanhados pelo líder do Movimento em Pernambuco, Paulo Mansan, os bispos iniciaram a visita, na verdade, não pelas terras, mas por um dos projetos do MST, nascido durante a pandemia: a campanha Mãos Solidárias, que mantém a Cozinha Solidária da Vila dos Milagres, no Ibura, responsável pela distribuição de cerca de 300 refeições por dia na comunidade.
A Cozinha Solidária da Vila dos Milagres é coordenada por Vinha, moradora da comunidade. Junto com outros voluntários, ela prepara os alimentos que chegam dos acampamentos e assentamentos do MST dos municípios de Vitória e Moreno: macaxeira, ovos, batata doce, verduras. “Eu deixo de fazer qualquer coisa, paro tudo que estiver fazendo, só para preparar essa comida pra comunidade”, comentou a cozinheira. “Fui dormir de madrugada pra cozinhar a macaxeira que chegou e acordei bem cedinho pra preparar tudo e entregar as quentinhas, porque ver o irmão de barriga cheia me deixa muito feliz”, completou.
Ainda pela manhã, os bispos conheceram os acampamentos Lula Livre, em Moreno, e São Francisco de Assis, em Vitória de Santo Antão. Nos dois, o cenário era o mesmo: casas de madeira com lona plástica, algumas casas de taipa, e muita gente plantando e colhendo. Famílias inteiras à espera da tão sonhada “titularidade da terra” prometida pela Reforma Agrária. O mecanismo do MST, reprovado por imensa parcela de brasileiros, quer garantir, no entanto, a sobrevivência e o crescimento dos mais pobres, sem lugar para morar e terra para produzir. O objetivo maior é, segundo Mansan, o combate à fome. “Através dos acampamentos, produz-se alimentos saudáveis, agroecológicos, e a gente chega dentro das comunidades, organizando as pessoas para preparar esse alimento em refeições para quem precisa”.
A Campanha Mãos Solidárias está presente também em algumas comunidades urbanas. Em Olinda, por exemplo, mulheres em situação de vulnerabilidade, orientadas pelo MST, plantam uma horta no terreno do Educandário Santa Tereza. “O cuidado com a horta funciona como uma terapia ocupacional e as mulheres ainda recebem parte da produção para levar para suas famílias”, explica Daniele dos Santos, uma das responsáveis pelos cursos de formação oferecidos pela Brigada Dom Helder do MST, nos territórios de Olinda e Paulista. “O excedente da produção é levado para as Cozinhas Solidárias”. Daniele sabe bem o que é precisar desse apoio: nasceu num assentamento rural em Santa Maria da Boa Vista – Assentamento Catalunha – no sertão de Pernambuco, onde ainda vivem seus pais. Veio para a capital fazer faculdade e quis colaborar com quem ajudou sua família a conquistar seu espaço. “Sou feliz fazendo o que faço”.
A presença da Igreja nesses lugares leva paz aos corações dos acampados e assentados. Nas palavras deixadas por onde passou, dom Paulo Jackson insistiu no “homem novo” que deve surgir a partir do Movimento. “Importante é fazer com que, dentro dessa luta, haja paz, haja cuidado e respeito com o meio ambiente. Não basta ocupar e conquistar a terra, mas construir a paz com valores solidários, respeito à natureza, cuidado com o descarte do lixo, cuidado com o outro através da partilha”, disse dom Paulo. “Fazer nascer um homem novo, uma mulher nova, construtores de um mundo melhor a partir de suas atitudes responsáveis e cidadãs”.
Dentre os momentos vividos pelos bispos nesta quinta-feira, houve plantio de árvore, colheita de macaxeira, visita a uma plantação experimental de arroz, conversas com o povo, orações e bênçãos. No período da tarde, o cenário mudou, mas a luta não. Dom Paulo Jackson foi com o MST até um dos locais beneficiados pela Campanha Mãos Solidárias: a Comunidade do Bode, no bairro do Pina, pertinho do conhecido bairro de Boa Viagem. De barco, o bispo enfrentou o difícil acesso às palafitas para distribuir as cestas de legumes, frutas, raízes e verduras vindas dos acampamentos. Um trabalho necessário num local que impressiona, não somente pelas condições precárias de habitação, mas pelo contraste social à volta. “É triste ver a discrepância de realidades: olhar da janela de uma palafita para os espigões caríssimos de Boa Viagem”, comentou o arcebispo de Olinda e Recife. “A Igreja precisa estar ao lado desses irmãos tão sofridos: são todos filhos de Deus, fazem parte de nossas comunidades eclesiais, de nossas paróquias, e merecem atenção, cuidado e ajuda da Igreja, no que for possível”.
Pascom AOR