Aproximamo-nos de mais uma celebração da Páscoa. Para além dos chocolates e panetones, este é o conteúdo fundamental da nossa fé cristã: Jesus Cristo, Deus encarnado em nossa história, morto na cruz como um criminoso, está vivo, ressuscitou. O túmulo está vazio, os lençóis de linhos estão revoltos ao chão. O sudário, dobrado num lugar à parte. Na condição de ressuscitado, há inúmeros “encontros” com os seus discípulos, em que Jesus lhes dá instruções, para que a Igreja assuma o protagonismo missionário pelos quatro cantos da terra. Esse querigma, esse anúncio primário e fundamental, deve ser dirigido a todos, pois foi isso que deu um novo sentido à vida dos seguidores e seguidoras de Jesus Cristo de todas as épocas. Trata-se de uma alegria indescritível. E os primeiros cristãos repetem qual mantra: “E disso, todos nós somos testemunhas” (At 1,8; 2,32; 3,15).
A morte e a ressurreição de Jesus mesclam aspectos históricos e teológicos. Ele é acusado de não cumprir a lei do repouso sabático, de que vai destruir o templo e de que blasfema por dizer-se Messias e Filho de Deus. Para Pôncio Pilatos, essas são fantasias religiosas. A única coisa que lhe interessa é saber se Jesus representa algum perigo de rebelião contra o Império Romano. Condenado, Jesus morre entre dois malfeitores. Os discípulos se dispersam. Praticamente todos traem, negam ou fogem.
Sua morte redentora é consequência de sua profunda obediência ao Pai e do seu amor incondicional por sua gente. Ele passou a vida doando a vida. A Cruz é o ápice de uma vida que se fez oblação. Resta um punhado de mulheres e o Discípulo Amado, símbolo do discipulado perfeito, amoroso e fiel. Tudo parece sombrio naquela sexta. No domingo, alguns já retornam ao seu povoado, à sua rotina escravizadora. Eles esperavam que algo novo acontecesse. As mulheres – elas, mais uma vez – falam de sepulcro vazio, de anjos e de aparição de Jesus ressuscitado. Ele está vivo! Provas objetivas, claras e distintas? Historicidade iluminista, quando, como, quem viu? São perguntas de outro quadrante. A ressurreição é uma afirmação autoenvolvente, ela nos implica, exige adesão vital, existencial, cobra-nos fé. O sepulcro vazio, o sudário dobrado e os encontros do Ressuscitado são sinais.
A ressurreição, portanto, não é uma afirmação estúpida de discípulos fanáticos, tampouco é uma verdade histórica do modelo racionalista. Jesus Cristo, reabilitado pelo poder da ressurreição, dá sentido e uma nova esperança à vida dos seus discípulos e discípulas. Jesus ressuscita como pessoa, verdade totalizante: sua vida, suas memórias, a proposta do Reino, a fidelidade ao Pai, sua entrega obediente. Na verdade, na crucifixão está a sua glorificação.
O sepulcro está vazio. Ele, vivo, está em nós, em sua Igreja. Por isso, a mensagem pascal mais importante é esta: somos chamados a ser ressuscitados com Cristo. Ele, na verdade, é o primogênito de uma multidão de ressuscitados. Ser pessoas pascais, testemunhas de um grande mistério de amor: eis o nosso desafio. Com o olhar fixo no céu, mas trabalhando para, de algum modo, antecipá-lo. Assim, nascem relações amoráveis, marcadas pela bondade, justiça e esperança. A fé na ressurreição nos capacita a trabalhar para que cesse toda fome, toda guerra, todo pranto, toda dor. E o que cremos, também celebramos: a Eucaristia se torna o canto de toda a Criação ao Deus Vivente, a quem, um dia, abraçaremos definitivamente. Feliz Páscoa de ressurreição!
Dom Paulo Jackson
Arcebispo de Olinda e Recife