Quanto mais velha mais preciosa



Por Felipe Aquino*

“A amizade é como os títulos honoríficos: quanto mais velha mais preciosa” (Goethe – 1749-1832).

Não preciso falar aqui da importância de se cultivar as boas amizades para ser feliz. O povo diz, com sabedoria, que “mais vale um amigo do que dinheiro o bolso”; é verdade. O dinheiro não resolve tudo, mas um bom amigo pode realmente resolver aquilo que o dinheiro não resolve. A Bíblia diz que quem conquistou um amigo, adquiriu um tesouro.

Milan Kundera, escritor tcheco, escreveu em seu livro “A Identidade”, que “a amizade é indispensável para o bom funcionamento da memória e para a integridade do próprio eu”. Chama os amigos de “testemunhas do passado” e diz que eles “são nosso espelho, através dos quais podemos nos olhar.”

Diz que “toda amizade é uma aliança contra a adversidade, aliança sem a qual o ser humano ficaria desarmado contra seus inimigos. Os amigos recentes custam a perceber essa aliança, não valorizam ainda o que está sendo contraído. São amizades não testadas pelo tempo, não se sabe se enfrentarão com solidez as tempestades ou se serão varridos numa chuva de verão.”

Há uma fábula antiga que mostra a importância da amizade concreta: é a da pomba e da formiga.

“A pomba percebeu que a amiga formiga caiu em um rio e se debatia para não morrer afogada; muito depressa a pomba tomou um pequeno galho no bico e colocou na água ao lado da formiga, e assim esta se salvou.

Passados os dias, um caçador apontava a sua espingarda para a mesma pomba, que dormindo no galho de uma árvore não percebeu o perigo que corria. Eis que a formiga viu; e antes que o caçador atirasse na pomba, jogou-se sobre ele e deu-lhe uma ferroada; o caçador errou o tiro e assim a pomba se salvou.”

A verdadeira amizade nos socorre quando menos esperamos. Podemos esquecer aquele com quem rimos muito, mas nunca nos esqueceremos daquele com quem choramos. O laço da tristeza é mais forte que o laço da alegria. Os corações que as tristezas unem permanecem unidos para sempre. Na prosperidade os verdadeiros amigos esperam ser chamados; na adversidade, apresentam-se espontaneamente. A fortuna faz amigos. A desgraça prova se eles existem de fato.

É preciso saber fazer e cultivar amizades; isso depende de cada um de nós; antes de tudo do nosso desprendimento e fidelidade ao outro. A grandeza de um homem é medida pela sua capacidade de comunhão. Quem busca um amigo sem defeito fica sem amigo.

Muito cuidado para não perder o amigo por uma futilidade. Seja amigo daquele que pode lhe ensinar muitas coisas, mesmo que ele tenha de lhe dizer verdades amargas. Uma amizade só é valiosa quando um faz o outro crescer.

Para conquistar um amigo é preciso criar um “deserto” dentro de si, aceitando que o outro venha ocupá-lo. Acolher o amigo é, em primeiro lugar, ouvir. São poucos os que sabem ouvir, porque poucos estão vazios de si mesmos, e o seu “eu” faz muito barulho. Se você souber ouvir, muitos virão lhe fazer confidências.

Se você quiser agir sobre o seu amigo, de verdade, para que ele mude, comece por amá-lo sincera e desinteressadamente. O maior esforço da amizade não deve ser apenas mostrar seus defeitos a um amigo, mas fazer com que ele veja os dele, sem lhe causar mágoa. O maior bem que podemos fazer a ele não é lhe oferecer nossa riqueza, mas levá-lo a descobrir a dele.

*Felipe Aquino é professor doutor em Física pela UNESP e membro do Conselho Diretor da Fundação João Paulo II.