Homilia de Dom Paulo Jackson na ordenação episcopal de Dom Josivaldo Bezerra
Meus irmãos e minhas irmãs, graça e paz!
Estamos reunidos, nesta Igreja Matriz de Santo Antão, na terra que iniciou a expulsão dos holandeses de Pernambuco e demarcou a identidade católica de nossa região, para celebrar a ordenação episcopal de um filho da querida e amada Arquidiocese de Olinda e Recife. Elevamos a Deus um vivo e sentido agradecimento, porque Ele ouviu nossas preces. Depois de quarenta e nove anos, o nosso clero oferece à Igreja um de seus filhos, para o serviço do episcopado. Saúdo, de modo especial, Dom Fernando Saburido, bispo emérito desta Arquidiocese, e Dom Ricardo Hoepers, secretário-geral da CNBB. Minha saudação aos demais irmãos bispos que aqui vieram rezar conosco. Mons. Josivaldo, alegramo-nos com os seus colegas presbíteros, os diáconos, paroquianos, amigos e amigas aqui presentes. Elevo a Deus um profundo agradecimento por seus familiares: Sr. Celso e Dona Josefa, seus pais, seus irmãos e seus sobrinhos. Certamente, no seio dessa simples família do Agreste pernambucano foi forjado o seu coração e o seu desejo de servir a Deus.
Aqui viemos não para uma mera “cerimônia”, muito menos um espetáculo, como diz o Papa Francisco, ao mudar o nome do cerimoniário. Aqui viemos para uma celebração, para, com Mons. Josivaldo, nos colocarmos diante do mistério de Deus, razão profunda da nossa fé. Jesus Cristo é o centro da nossa existência. É isso que deve caracterizar o ministério de um bispo. Sua missão não se resume em você mesmo, mas ilumina a missão de toda a Igreja no coração da história, com os desafios e crises hodiernos. Nossa sociedade espera de nós, como Igreja, à luz desse mistério, que é a missão do bispo, alguma iluminação e uma palavra qualificada, que aponte para o infinito de Deus. Por isso, nós bispos não somos gerentes da administração, ou coordenadores de cleros, muito menos fazedores de coisas, mesmo que sejam coisas boas, a partir de um planejamento pastoral. Não somos meros planejadores e utilizadores de métodos pastorais infalíveis, caracterizados por uma eficácia neopelagiana. Somos, antes de tudo, homens de fé, de uma paixão enorme por Nosso Senhor Jesus Cristo, capazes de subir com ele para Jerusalém, a cidade da cruz e da ressurreição. É isso que São João chama de conhecimento, aquele mesmo que caracteriza o amor entre o Pai e o Filho.
Na Igreja Católica, o Episcopado é o grau mais alto do Sacramento da Ordem. Contudo, como bem estabeleceu a Lumen Gentium e, mais recentemente, o Sínodo dos Bispos, antes de qualquer ministério está o Sacramento do Batismo: “Do Batismo em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo brota a identidade do Povo de Deus e nasce a Igreja sinodal missionária” (PIS, n. 15). Neste povo santo de Deus, a comunhão dos fiéis é sinal grandioso da unidade: da comunhão das Igrejas e dos bispos, da comunhão com o apóstolo Pedro e seus sucessores (PIS, n. 18). “O Batismo é fundamento da vida cristã”, pois, no Espírito, se redescobre a variedade das vocações, dos carismas e ministérios (PIS, n. 21).
Reencontramos, caro Mons. Josivaldo, a graça de sermos ovelhas e pastores de ovelhas. Cristo Jesus, por meio de sua Igreja, Povo de Deus, Corpo de Cristo, Templo do Espírito, Mistério de Comunhão e Sacramento do Reino, nos confia, como sucessores dos seus apóstolos, a tarefa de continuar a sua mesma missão. Em comunhão com os seus colaboradores, os presbíteros e diáconos, os bispos recebemos a missão de presidir a Igreja na caridade, como mestres da doutrina, sacerdotes do culto divino e ministros do governo (LG, n. 20). É isso que nos ensina o Bom Pastor.
Em meio às dolorosas experiências do Exílio Babilônico, o povo hebreu tornou-se povo em diáspora. A reunificação e a restauração do povo são pensadas como um novo êxodo. Deus comunica, por meio do Profeta Ezequiel, que Ele vai procurar suas ovelhas e tomar conta delas; vai reuni-las, cuidar das ovelhas dispersas e reconduzi-las de todos os países longínquos. Deus conduzirá suas ovelhas sobre os montes e os vales habitáveis de Israel, pois ele é o Bom Pastor. À luz do agir de Deus, o profeta oferece critérios para se fazer a distinção entre os falsos e os verdadeiros pastores. Os falsos pastores se apascentam a si mesmos, exploram as ovelhas; são mercenários, dinheiristas e violentos. Maltratam as ovelhas, não as apascentam, não as alimentam com o Mistério Eucarístico nem matam sua sede da Palavra. Por isso, Deus mesmo quer procurar a ovelha perdida, reconduzir a extraviada, enfaixar a de perna quebrada, fortalecer a doente e vigiar a ovelha gorda e forte.
Jesus se nutre desta fonte espiritual: retoma a tradição bíblica de Davi, o rei pastor; bebe da fonte espiritual dos Salmos e da tradição profética de Ezequiel. Em Jo 10, Jesus desenvolve o raciocínio em três movimentos: reflete sobre a diferença entre a atuação do pastor e os ladrões (1-6); identifica-se com a Porta do redil (7-10); e, finalmente, qualifica o pastor com o adjetivo de bom/belo e diferencia o seu comportamento daquele do mercenário (11-18). O bispo é chamado a ser bom pastor, igualmente a Cristo Jesus, vivenciando as sete principais características que aparecem no texto: 1) ele deve entrar pela Porta, que é o próprio Cristo; 2) ele conhece as suas ovelhas e elas conhecem e ouvem sua voz; 3) há proximidade entre o pastor e as ovelhas, pois ele as chama pelo nome; 4) ele caminha à frente delas, conduzindo-as para fora; 5) ele trabalha para que as ovelhas tenham vida, servindo-lhes água e pastagem; 6) ele é capaz de doar a vida pelas ovelhas, protegendo-as contra os lobos e ladrões; 7) ele se preocupa com outras ovelhas, de outro redil, que também devem ser guiadas, para que se forme um só rebanho. Sem dúvida, o dado que mais nos impacta é o fato de o bom pastor doar a vida por suas ovelhas. Disso, nasce a qualidade e a autoridade de sua palavra, capaz de gerar esperança no coração do ser humano em desatino.
Mons. Josivaldo, você é chamado a isto: a doar a vida pelas ovelhas que lhe foram confiadas, sacrificar-se por elas; alimentá-las com a Palavra, a Eucaristia e a Caridade; abrir-lhes a perspectiva missionária, conduzindo-as para fora de sua autorreferencialidade; sanar suas feridas; devolver-lhes a esperança; fazê-las compreender a perspectiva ecumênica da missão, unindo-as com ovelhas de outros redis. O modelo é Cristo, na sua relação com o Pai: “assim como o Pai me conhece e eu conheço o Pai”.
Caro Mons. Josivaldo, Paulo assegura que o Espírito Santo suscita, no seio do corpo eclesial, carismas e ministérios, em vista da unidade e da edificação do único corpo de Cristo Jesus. O ministério episcopal pertence à Igreja e é umbilicalmente vinculado a ela. “Quem é ordenado bispo não recebe prerrogativas e tarefas que deve desempenhar sozinho. O ministério do bispo é um serviço na, com e para a comunidade” (PIS, n. 69-70). Como sucessor dos apóstolos e em ininterrupta sucessão, como membro de uma Conferência Episcopal, cum Petro et sub Petro, você é enviado ao mundo para anunciar o Evangelho, santificar os povos e apascentá-los na caridade. Sinto profunda alegria de tê-lo como irmão no serviço e na comunhão. De fato, o episcopado é um serviço e não uma honraria. Por isso, procure amar com amor de pai e irmão todos aqueles que Deus lhe confiou, desempenhando sua missão até a morte. Conserve a pureza e a integridade da fé católica. Seja, de modo especial, compassivo e misericordioso para com os pobres, pecadores e errantes. Conte com a ajuda dos santos e anjos, especialmente de Maria Santíssima. E, por favor, ore por nosso ministério e pela Igreja dessa querida e amada Arquidiocese de Olinda e Recife. Como pede o Sínodo, vamos tentar encontrar juntos mais clareza para a missão do bispo auxiliar (PIS, n. 71).
Querido Josivaldo, você será ungido na fronte para ungir os corações aquebrantados com o bálsamo da misericórdia. Seja o anel sinal de seu amor incondicional à Igreja esposa. Sejam as ínfulas da mitra expressão do brilho de sua santidade. Seja o cajado símbolo de sua solicitude pastoral e missionária. Como é belo quando Paulo reúne os presbíteros de Éfeso para transmitir-lhes as orientações de como cuidar do rebanho, nos momentos em que surgem os lobos. O segredo do nosso ministério não está num poder que vem de fora, ou somente da bula que o papa envia, ou na capacidade de falar e de possuir uma cátedra. O segredo de nosso ministério está na resposta de Maria, que você escolheu como lema: “Secundum verbum tuum”. A crise de liderança talvez nasça da nossa incapacidade de viver esta profunda experiência, que caracteriza a vida de Maria: “Sou a escrava do Senhor. Faça-se em mim segundo a sua Palavra”.
Caro Mons. Josivaldo, o exemplo de tantos bispos santos o inspire no exercício do seu ministério. Recordo, com muito carinho, Dom Expedito Lopes, Dom Hélder Câmara e Dom Vital, somente para citar três deles. Que estes e tantos santos e santas o acompanhem. Amém!
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Discurso de agradecimento de Dom Josivaldo Bezerra em sua Ordenação Episcopal
Excelentíssimo e Reverendíssimo Dom Paulo Jackson, nosso querido arcebispo;
Excelentíssimos Senhores Bispos aqui presentes;
Excelentíssima Senhora Vice-governadora Priscila Krause;
Excelentíssimos Senhores Prefeitos Paulo Roberto, João Campos, Lula Cabral, Mary Gouveia, Joselito Gomes, Mano Medeiros;
Excelentíssimos Senhores desembargadores e juízes;
Reverendíssimos padres, meus irmãos,
Queridos religiosos e religiosas,
Estimados seminaristas,
Meus irmãos queridos,
“Cuidem de vocês mesmos e de todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo os colocou como guardiões, para pastorearem a Igreja de Deus, que Ele comprou com o Seu próprio sangue”
(Atos 20,28).
Essa passagem dos Atos dos Apóstolos ressoa profundamente em meu coração nesta ocasião solene. Ser bispo significa ser chamado a pastorear o rebanho do Senhor, não como um dono, mas como um humilde servo que cuida de uma herança preciosa, adquirida pelo sacrifício redentor de Cristo.
O Papa Bento XVI, ao refletir sobre o ministério episcopal, disse: “O bispo é aquele que, em nome de Cristo, vela pela comunhão da Igreja, um serviço que exige vigilância, proximidade e total doação.” Ele nos recorda que a missão do bispo é ser um sinal visível da unidade na fé e no amor, sendo ao mesmo tempo um incansável promotor da esperança.
Inspirado por essa visão, assumo esta missão com humildade, certo de que a minha força não está em minhas capacidades, mas na graça de Deus, que age em nossa fraqueza. Que eu possa, com a ajuda do Espírito Santo, cuidar deste rebanho com o coração de um pastor, sempre fiel à vontade do Senhor.
Bendito seja Deus pela presença de todos vocês neste dia especial, em que a graça de Deus se manifesta de forma abundante em minha vida e em nossa Igreja. Agradeço profundamente a cada um que, com coração generoso, uniu-se em oração e presença para este momento singular.
Antes de tudo, elevo a Deus o mais profundo agradecimento por este dom imerecido do episcopado. Sou apenas um servo chamado a responder à Sua vontade, e é com temor e confiança que acolho este ministério. Como Maria Santíssima, repito hoje: “Fiat mihi secundum Verbum Tuum!” (“Faça-se em mim segundo a tua palavra!” – Lc 1,38). Que a minha vida seja sempre guiada por esta entrega total à Sua Palavra.
Dirijo meu agradecimento filial à Virgem Maria, Senhora de Fátima, modelo de fé e obediência. Sob sua intercessão materna, confio este novo caminho. Que Ela me inspire a sempre servir com humildade e amor ao povo de Deus.
À minha família, minha gratidão sem medidas. Vocês foram meu primeiro porto seguro e a base da minha vocação. Obrigado pelo apoio constante, pelas orações e pelo testemunho de fé que me acompanham desde sempre.
De forma especial, recordo Monsenhor Paulo Cremildo, que tanto contribuiu para minha formação humana e espiritual. Sua memória permanece viva em meu coração e na história da nossa Igreja. Que consiga corresponder em minha vida às tantas lições de amor que ele me deu.
Agradeço de coração ao Papa Francisco, pela confiança depositada em mim ao me confiar o ministério episcopal como bispo auxiliar da Arquidiocese de Olinda e Recife. Minha filial cooperação e adesão ao seu ministério petrino tão belo e desafiador. Graça singular é receber e poder iniciar esse ministério no décimo segundo dia deste Ano Jubilar. Obrigado, Santo Padre, por animar os cristãos do mundo inteiro a não perderem a esperança, enquanto peregrinam nesta Terra.
Ao senhor Núncio Apostólico, minha gratidão pelo apoio e pela proximidade neste momento de graça. Por suas palavras de encorajamento e confiança na missão.
Minha gratidão também a Dom José Cardoso Sobrinho, que me ordenou sacerdote e sempre foi um pastor zeloso e inspirador em minha caminhada vocacional. Minhas preces por Dom José nesse momento de fragilidade física e a certeza de minha eterna gratidão.
Dom Fernando Saburido, obrigado pelo testemunho de pastoreio e por seu incentivo em minha trajetória. Obrigado pela confiança durante todos os seus anos de governo em nossa Arquidiocese.
Dom Ricardo, quanto me anima sua presença nesta noite. Seu trabalho incansável em busca da unidade em nossa Igreja do Brasil tem sido um sinal belo e profético. Conte conosco, nosso trabalho e nossa amizade.
A Dom Paulo Jackson, meu profundo respeito e gratidão. Seu incansável apostolado em nossa arquidiocese tem me edificado profundamente. Como arcebispo e pastor, sua confiança me fortalece. Nossa Arquidiocese é feliz por ver seu trabalho incansável. Sua profundidade em cada palavra, em cada homilia, em cada discurso nos enriquece profundamente. É uma honra servi-lo como bispo auxiliar nesta arquidiocese.
Aos meus queridos irmãos sacerdotes desta Igreja Particular, muito obrigado por essa caminhada de 26 anos nesse presbitério. Alegria imensa é saber que mesmo em uma nova missão continuarei convosco, servindo a cada um. Contem muito comigo.
Lembro com carinho as comunidades que marcaram minha caminhada sacerdotal: a Paróquia de Santana, em Gravatá, minha paróquia de origem, que me formou na fé desde a infância; a Paróquia de Santo Antônio, no Cabo de Santo Agostinho, onde dei meus primeiros passos como padre; a Paróquia de Nossa Senhora da Apresentação da Escada; e a Paróquia de Santo Antão, em Vitória de Santo Antão, onde atualmente sirvo com alegria. Vocês são testemunhas vivas da minha vocação e da graça de Deus em minha vida.
Agradeço às equipes que trabalharam arduamente para a organização desta celebração. À Prefeitura da Vitória de Santo Antão, na pessoa do Senhor Prefeito, Paulo Roberto, meu reconhecimento pelo apoio generoso na estruturação deste evento. Obrigado à Arquidiocese de Olinda e Recife, aos colaboradores e amigos que se desdobraram para tornar este momento tão belo.
Aos bispos, sacerdotes, seminaristas, religiosos e religiosas, autoridades civis e militares, e a todo o povo de Deus aqui presente, meu sincero obrigado por compartilharem deste momento de oração e festa. Sua presença é um testemunho de unidade e comunhão em Cristo.
Ao assumir a missão de bispo auxiliar da Arquidiocese de Olinda e Recife, coloco-me inteiramente à disposição de Deus e de Sua Igreja. Com humildade e zelo pastoral, quero ser um instrumento de paz, unidade e serviço. Conto com suas orações para que, sob o lema “Secundum Verbum Tuum!”, eu possa sempre dizer sim ao chamado do Senhor.
Que Deus nos abençoe e nos fortaleça na caminhada. Nossa Senhora, Rainha dos Apóstolos, interceda por todos nós. Muito obrigado!