Em primeiro lugar, a situação dos fiéis católicos divorciados e que contraíram uma segunda união constitui um problema complexo e doloroso para a pastoral da Igreja, a qual acompanha com preocupação de Mãe e Mestra. Ela que quer estar perto de seus filhos, inclusive nas situações mais dolorosas com a misericórdia, e não pode nem deve abandonar os seus filhos divorciados que se casam novamente, porém deve ajudar os divorciados, procurando com caridade solícita que eles não se considerem separados da Igreja.

Contudo, diante de questionamentos sobre a mudança da disciplina sobre a restrição da comunhão para os divorciados casados em segunda união, a Igreja, como fez o Beato João Paulo II e o Santo Padre Bento XVI, reafirma a sua prática, fundada na Sagrada Escritura, de não admitir à comunhão eucarística, porque a aliança matrimonial indissolúvel é expressão do amor indissolúvel de Cristo e sua Igreja, do qual a Eucaristia é o sacramento, sendo assim a Eucaristia um sacramento esponsal. A Eucaristia corrobora, confirma a unidade e o amor indissolúvel. A Exortação Apostólica Familiaris Consortium e a Exortação Apostólica Pós-sinodal Sacramentum Caritatis afirmam que a situação dos divorciados recasados contradiz objetivamente a união de amor entre Cristo e a Igreja que é significada e realizada na Eucaristia. Outra razão apresentada por João Paulo II é que pode induzir os fiéis ao erro sobre a indissolubilidade do matrimônio. Sabe a Igreja que muitos dos seus filhos até sofrem por conta de que não podem comungar e muitos dos divorciados em segunda união têm conhecimento do valor da Eucaristia na vida do cristão. Mas a Igreja é servidora da Palavra de Deus, não está acima dela. É neste sentido que a Igreja tem atuado. Não se trata de uma punição, mas uma realidade do Evangelho: não esqueçamos que o mesmo Senhor que falou da importância da Eucaristia – “se não comerdes a minha carne e não beberdes o meu sangue não tereis a vida em vós” – também disse: “o que Deus uniu o homem não separe”. Mais do que sentir angústia ou até revolta, os fiéis em segundo casamento devem cultivar no coração o desejo ardente da Eucaristia.

A Igreja sugere a prática da comunhão espiritual, que é o ato piedoso de desejo de se unir espiritualmente ao Senhor na Eucaristia, é desejar receber os efeitos da Eucaristia, embora não possamos dizer que a comunhão espiritual tenha igual valor à comunhão eucarística. Ela é recomendada pelos santos, por exemplo, Beato João Paulo II, Santa Teresa de Jesus, Santo Afonso de Ligório, ao longo da história e muito alimentou os corações de pessoas santas. São Tomás, com doutrina segura, afirma que há duas maneiras de receber a Eucaristia, a sacramental e a espiritual, e que, pela recepção espiritual, recebe-se o efeito deste sacramento: o homem se une a Cristo. A comunhão espiritual inclui o voto ou desejo de receber o sacramento. Na hora da Santa Comunhão, os que estão impossibilitados podem manifestar a Jesus o desejo de recebê-lo e confidenciar a própria situação e confiar nele, oferecendo-se em sacrifício espiritual de louvor, de adoração, de prece, de pedido de misericórdia. E é esta a participação ativa na Missa como nos pede o Concílio Vaticano II.

Por não poderem comungar significa que os divorciados recasados estão fora da Igreja? Não! Eles continuam a pertencer à igreja. A Igreja acompanha com preocupação e atenção de mãe, recomendado que cultivem um estilo cristão de vida, através da participação da Santa Missa, ainda sem receber a comunhão, da escuta da Palavra de Deus, da adoração eucarística, da oração, da cooperação na vida comunitária, do diálogo e acompanhamento com sacerdote na direção espiritual, no serviço da caridade, das obras de penitência, do empenho na educação dos filhos. Isso é pouco? Evidente que não. Ah, se a maioria dos católicos assim vivesse! O Santo Padre Bento XVI recentemente manifestou sua aproximação a estes filhos que estão nesta situação: “Considero grande tarefa duma paróquia, duma comunidade católica, fazer todo o possível para que elas sintam que são amadas, acolhidas, que não estão «fora», apesar de não poderem receber a absolvição nem a Comunhão: devem ver que mesmo assim vivem plenamente na Igreja. Mesmo se não é possível a absolvição na Confissão, não deixa talvez de ser muito importante um contacto permanente com um sacerdote, com um diretor espiritual, para que possam ver que são acompanhadas, guiadas. Além disso, é muito importante também que sintam que a Eucaristia é verdadeira e participam nela se realmente entram em comunhão com o Corpo de Cristo. Mesmo sem a recepção «corporal» do Sacramento, podemos está, espiritualmente, unidos a Cristo no seu Corpo. É importante fazer compreender isto. Oxalá encontrem a possibilidade real de viver uma vida de fé, com a Palavra de Deus, com a comunhão da Igreja, e possam ver que o seu sofrimento é um dom para a Igreja, porque deste modo estão ao serviço de todos mesmo para defender a estabilidade do amor, do Matrimônio; e que este sofrimento não é só um tormento físico e psíquico, mas também um sofrer na comunidade da Igreja pelos grandes valores da nossa fé. Penso que o seu sofrimento, se realmente aceite interiormente, seja um dom para a Igreja. Devem saber que precisamente assim servem a Igreja, estão no coração da Igreja.”

Quanto à solicitação de uma bênção para a segunda união, o respeito pelo sacramento do matrimônio proíbe, afirma João Paulo II, que os pastores, por qualquer motivo ou pretexto mesmo pastoral, fazer, em favor dos divorciados que contraem uma nova união, cerimônia de qualquer gênero porque dariam a impressão de celebração de novas núpcias sacramentais e induziriam em erro sobre a indissolubilidade do matrimônio. Pessoalmente, aconselharia convidar o sacerdote da Paróquia por ocasião de aniversário natalício de um dos cônjuges ou dos filhos ou por ocasião do nascimento dos filhos ou para bênção da residência e, nestes casos, poderia ser dada a bênção própria para esses acontecimentos da vida familiar, segundo o Ritual de Bênção, e não bênção para a segunda união. A bênção matrimonial segundo o Ritual Católico só é possível dentro da celebração do Matrimônio. Os padres não têm autoridade para liberar a comunhão nem para conceder bênção da segunda união ou das alianças e só poderão atuar com verdadeira compaixão e caridade agindo humildemente na verdade.

Se um casal ou um dos cônjuges tem dúvida de que o primeiro matrimônio foi realmente válido, procure a nossa Câmara Eclesiástica, na Cúria Metropolitana, no horário da manhã, nas quartas e sextas-feiras, e poderá receber informações para um possível processo de declaração de nulidade do matrimônio, não de anulação, pois não se anula casamento. O serviço da Pastoral Familiar, em sintonia com o ensinamento da Igreja, tem um setor próprio para acompanhar e ajudar os casais divorciados em segunda união a fim de que se sintam filhos da Igreja e que conheçam a misericórdia de Cristo que veio não para chamar os justos, mas os pecadores que precisam de conversão, e vão conhecendo a verdade do Evangelho – e a verdade liberta – e confiando na lei de Deus e nas disposições da Igreja que protegem o matrimônio e a família, cuidando do bem espiritual de seus filhos.

Pe. Moisés Ferreira de Lima
Vice-chanceler da Cúria e Membro da Comissão Arquidiocesana
de Pastoral para a Doutrina da Fé